Eu estou ok.

Não sai da minha boca, mas eu penso a todo instante. Eu tô a fim de você. Não assumo para mim mesmo. Vivo dormindo e acordando fazendo cerimônia. Segredo da alma, às vezes não suporto esse gostar de você. E o mais engraçado é que não foi coisa de agora, de hoje. Há pouco mais de dois anos eu te conheci, você comprometido, viramos amigos e tudo estava bem. Durante todo esse período, nunca me dei conta. Tá, confesso: uma hora ou outra eu imaginava alguma coisa parecida. Mas era inconsciente. “Ah, pára! Só amigos”.

Agora, você solteiro e eu, como sempre, também. Dei conta de que cairia fácil em seus braços quando dormi pensando na possibilidade de alguma coisa acontecer e acordei torcendo para que virasse realidade. Um carinho. Um aperto de mão. Dormir de conchinha. Quem não quer? Seus passeios pelo mundo, sua alma independente, tudo tocou em mim. Cupido pilantra, me enganou durante todo esse tempo. Caprichou na mira da flecha. Acertou em cheio esse coração. Logo eu que, agora, não queria nada. Não quero. Aliás, não sei mais. O plano de arrumar as malas e sair por aí, crescendo na vida, existe. Mas, me pergunto: e com você? O que eu faço? Está acontecendo mais uma vez. E eu, de novo, não sei como escapar disso. Estou ok.
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falta isso

de todas as sortes da vida, a única que me falta é você.
eu vivo um jogo de timing errado, de cenas atrasadas e delays disparados. o pior de viver assim não é não viver, mas, sim, saber que por pouco as coisas não se encaixariam. esse traz-e-vem, esse atraso, esse acaso desajeitado faz de mim alguém triste quando contraceno momentos de silêncio. a inconsciência logo lembra, logo cobra, logo traz à tona o fardo que é viver em tempos quase certos, sempre errados. é sempre por pouco, por minutos, por um dia.

eu desejo um destino no time perfeito há anos. 'será que há algo de errado comigo?' é o repeat do clichê viver-a-vida. às vezes, penso que é o jogo dos sete erros na cartilha infundada da rotina. mas com a mão na consciência, na esperança de, enfim, encontrar os sete erros, extrapolo os contos. são oito, nove, dez. são muitos. são mais que sete. será que os ponteiros só se acertam quando todos os erros forem consertados? 
será que os quase desencontros só são quase para mostrar a urgência, a necessidade de alinhamento, desses somente meus culpados erros perante a vida? não sei.

só sei que preciso andar passo a passo com a vida.

só sei que desgosto do desritmo intrínseco desse dia a dia. 
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A complexidade de ser um S.

S. está atrasado. E o outro está adiantado. Agora, S. está atrasado. E o outro está descompassado. A vida de S. sempre foi assim: uma desritmia excêntrica do amor.

O grande problema da vida de S. é, coitado, a facilidade de cometer platonices por aí. Era um domingo à tarde quando S., distraído pelas redes sociais, viu uma foto dele. Pela primeira vez. Não, não era a pessoa mais bonita do mundo. Não era o padrão de beleza que atrai o mundo todo. Era só um alguém que, em redes sociais, sabia ser legal. Alguém que ao invés de usar smiles do tipo “:)”, prefere os smiles do tipo “:]”. Com colchetes. E isso faz uma diferença.
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só hoje

hoje eu repensei minhas roupas, revi meu comportamento, comprei produto de beleza.
hoje, pior ainda, eu imaginei você comigo.
hoje eu andei diferente, olhei no espelho, pensei duas vezes.
hoje eu não acostumei comigo mesmo.
hoje, só então, percebi o efeito desse sintoma em mim.
hoje, bem pior ainda, por causa de você eu estou me reconhecendo.
hoje eu quero ir para melhor.
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de novo

está acontecendo de novo.
como sempre, o alvo é você.
mas não, não exponho tudo. não jogo a fundo.
eu blefo.
por você.
eu desenvolvo.
de você.

ao contrário do típico perfil astral, estou despejando todo o meu desespero inicial e a vontade de manter um contato em outras pessoas.
enquanto isso, no cenário de você,
só existe eu algumas vezes.
em dias pausados.
agoniados.
mas eu estou resistindo de mim para chegar mais em você.

eu e você é o que eu quero ser.


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caro amor

há quem diga:
viver de amor é bom, mas não paga a conta.

todo dia quando beijo seus problemas,
justifico com amor.
quando deito na cama e abraço nossa casa,
justifico com amor.
irracional, eu sei.
mas eu justifico, amor.

a verdade é que esse sentimento verde, cor-dinheiro, paixão-moeda não serve para mim.
só serve se for puro, amor.
só serve se for amor.
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rimas despreparadas

é tão certo resolver o problema, saciar o dilema.
colocar-me como tema, nosso amor no poema.

é tão chato dar de cara no assoalho.
pôr amor no retrato, calçar o sapato.

é tão difícil fazer uma cena, dizer 'uma pena'.
disfarçar-se de trema, ver a vida pequena.

é tão fácil viver desamparado, cantar vapor barato.
viver misturado, sentir-se despreparado.

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trava-língua do aperto

ah, lá vem o aperto!
está perto o aperto!

o peito perto do aperto dói.
o vazio aperta o aperto do peito, bagunça o peito no aperto.
aperto, perto, peito são três palavras que combinam com o vazio do meu peito.

ah! o aperto no peito...

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aniversários

todo ano é a mesma coisa.
a expectativa de viver a mesmice amorosa se assemelha a de estar mais velho.
maturidade vem. chega.
nada acontece.

aí, acontece.
e é só tristeza.
é lembrado que amores são sintomas de acúmulo dos aniversários.
pois, afinal, no final, é tudo ciclo, desnecessário-aniversário.
mal vindos, bem vindos,
aceite: são aniversários

sempre.

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estar encalhado

é muito engraçado.
assumo, sou encalhado. engraçado né?
eu sei, tô repetindo. mas é.

engraçado é o mundo.
é o mundo que te coloca no posto de ter que estar.
ter que ter.
e se o ter demora a chegar: bem vindo, encalhado.

ai ai. esse negócio, deixa de lado; ô, encalhado!

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de interesse

hoje eu queria uma massagem,
um cafuné,
um café na cama,
e - de quebra -
um amor.
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balança

eu sou um equilibrista de contra-pesos e lembranças.

lembrança: de olhos apertados e coração também, vejo muito de nós por aqui.
lembro das mãos dadas ao vento; aquele momento de ser foi, de longe, o melhor.

contra-peso: mas aí me complico e lembro da distância.
a gente sabe, ela é uma coisa chata e perigosa.
vilã da história, cheia de si e do desacreditar, ela engana a mim, a você, a qualquer um.

lembrança: só que mesmo insistente, ela - a vilã distância - se desfaz aqui.
porque eu acredito.
assim, sabe? sem querer desafiá-la, vou acreditando.
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difícil

- promete?
- o quê?
- que o amor é uma doença, só que do bem.
- não.
- e se o amor não for doença?
-  ele fica prisão.

ficar bem do amor é uma coisa difícil.
livrar dele de uma vez, também.


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a dois

desculpa, a casa tá uma bagunça.
não repara.
entra, faz faxina, limpa tudo que ficou.
fica, toma uma xícara de sei lá o quê, pode ser de mim, pode ser de você.
espera, faz sala, conta uma piada, ri da minha cara.
mora, casa e nunca, nunca separa.
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estar carente é faltar uma parte de si

falta um encosto, parte do corpo, coração.
eu não gosto de estar carente.

parece ser fácil ser. as coisas saem mais fáceis, a enxurrada de sentimentos acontece.
não é.
estar, asseguro, são dias de neblina fina que ninguém vê, às vezes nem você.
mas sente.

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um quarto

todo dia é a mesma coisa.
acorda, espreguiça, caio em mim,
lembro de você.
cansa, deita no travesseiro, saindo de mim,
lembro de você.

meu quarto já não aguenta mais a mesmice que é insistir em você.
e o pior de tudo é que acomodado, no cômodo do meu quarto, continuo, perdido, na rotina
de você.
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remember

estudos apontam.
coração: a ponta.

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disparado

você sempre foi meio cinza-normal na vida. bastou uma semana para, inconsciente, eu trocar o tom de tudo.
o doutor disse: é grave, não é daltonismo e o remédio é ficar junto.
ávido por uma boa resposta, contrariei: mas, dr., não há como.

(silêncio)

diagnóstico dado, a única anestesia catalisadora seria ele, o tempo.
enquanto isso, disparado o meu coração bate por você.


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culpado

de tanto repetir, calejar, reviver, voltar. depois de tanta meia volta, descrença, descoragem.
foi depois de tanto chove e não molha que, assim, meio sem sentido, resolvi conversar com meu cotovelo.

alguns chamam de carência, ócio ou ausência de vida sentimental ativa.
eu chamo de consequência de timidez mal resolvida.

tudo culpa do cotovelo.

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